domingo, 25 de maio de 2025

CONFLITO NUCLEAR NATO vs PACTO DE VARSÓVIA – Tácticas e Dilemas (Episódio 5) - [M2615 - 38/2025 ]

Episódios anteriores: 1 - 2 - 3 - 4

BGM-109G Gryphon, o “Xeque-mate” da NATO (cont.)

O processo de lançamento de um míssil de cruzeiro GLCM envolvia alguns passos pré-determinados.  Imaginemos um episódio de grande tensão política em meados dos anos 80.  Entre várias medidas de dissuasão, a NATO dispersa baterias de “Glick-em” para áreas remotas, mas fortemente protegidas.  Uma das baterias, localizada na base de Florennes, na Bélgica, desloca-se durante a noite para uma área 40km a Noroeste da cidade de Charleroi.  Numa primeira fase, o impressionante comboio de veículos move-se por entre as apertadas estradas secundárias da província Belga debaixo do olhar de admiração e apreensão dos muitos civis despertos pelo roncar rouco dos camiões MAN 8x8.  A dada altura os camiões abandonam a estrada e mergulham na escuridão de um bosque perto de Perwez - os condutores, equipados com óculos de visão nocturna, não necessitam de faróis nem de iluminação artificial.  Além do mais, já conhecem bem a zona, resultado dos inúmeros treinos e exercícios conjuntos.  Um jeep civil, inadvertidamente ou não, tenta seguir o mesmo caminho – talvez apenas um agricultor a regressar á sua quinta – mas é imediatamente barrado por vários soldados das forças especiais Belgas, que surgem sem aviso por entre os arbustos.  Os quatro TEL espalham-se por entre as árvores, conectados por fibra óptica ao LCC – o segundo LCC aguarda a 1500 metros de distância, em caso de necessidade.

O camião MAN M1013, de 10t e tracção às oito rodas, era o veículo padrão das baterias de GLCM, não só usado como base para os veículos lançadores (TEL) e postos de comando (LCC) mas também como veículo de manutenção e reparação.  Muito apreciado pelos americanos que confessavam, nunca abertamente claro, ser muito superior aos veículos fabricados nos “States”, especialmente em conforto, facilidade de condução e qualidade de suspensão.

Ao passar das 2h00 da manhã, a bordo do LCC, dispara um aviso mensagem de satélite, directamente do SACEUR.  Os dois oficiais, sentados á frente de um teclado, aguardam nervosamente enquanto o computador descodifica e autentica a ligação.  Não é uma mensagem de voz mas um texto pré-gravado, ou Emergency Action Message (EAM).  O alvo não é mencionado por nome, apenas por código, neste caso Strike Package 36.  As coordenadas e o perfil de voo já estão introduzidas no computador, apenas é necessário actualizar os dados meteorológicos mais recentes e introduzir os códigos de lançamento para cada “Glick-em” – processo que demoraria menos de 20 minutos.  O alvo é o Quartel-General da Frota Soviética do Báltico em Krondstadt, São Petersburgo.  Estas armas são propriedade dos EUA e, apesar de localizadas na Bélgica, não existe acordo de “dual key”.  Aos dois oficiais a bordo do LCC apenas resta introduzir o código de seis letras e pressionar os dois botões “execute” em simultâneo.  Existe, no entanto, um acordo vago que, em caso de guerra, o lançamento de armas nucleares deve ser decidido junto com a nação anfitriã.  No entanto, a autorização para o disparo de “Glick-em”s significaria que a guerra nuclear total já estaria em andamento e as comunicações estariam severamente danificadas – e, mais importante, o tempo das gentilezas diplomáticas já se teria esgotado.  Felizmente, tal cenário nunca se tornou realidade.

Nestas duas imagens vemos uma bateria de “Glick-em” no seu habitat natural.  Na foto acima, á esquerda, um dos veículos transportadores-lançadores (TEL) e o posto de comando (LCC) á direita.  Na foto abaixo, dois dos soldados que asseguram a segurança da bateria posam para a fotografia armados com espingardas M16A1 (o da direita com lançador de granadas M203) – a nostalgia dos anos 80 e 90 é incontornável...

Outra questão de grande discussão no seio da NATO foi a distribuição e quantidade, das baterias de GLCM na Europa – um balanço difícil entre a credibilidade da dissuasão e as sensibilidades diplomáticas de cada membro da Aliança.  A Inglaterra já era uma potência nuclear e a Noruega e Dinamarca recusaram armas nucleares no seu território.  Turquia e Grécia?  Demasiado instáveis.  A Itália aceitou participar, assim como a Holanda e a Bélgica, mas com muita relutância.  Depois de infindáveis discussões finalmente chegou-se a uma decisão em Dezembro de 1979 – mais ou menos.  Os Belgas pediram mais seis meses para decidir se saiam e os Holandeses mais 18 meses (?) para decidir se ficavam…  O esquema final, provisório, foi este;

Alemanha Federal (Wuschheim) - 96 GLCM (6 baterias / 24 TEL transportadores-lançadores), 

Holanda (Woensdrecht) - 48 GLCM (3 baterias / 12 TEL transportadores-lançadores), 

Itália (Comiso) - 112 GLCM (7 baterias / 28 TEL transportadores-lançadores), 

Bélgica (Florennes) - 48 GLCM (3 baterias / 12 TEL transportadores-lançadores),

Inglaterra (Molesworth) - 64 GLCM (4 baterias / 16 TEL transportadores-lançadores),

Inglaterra (Greenham Common) - 96 GLCM (6 baterias / 24 TEL transportadores-lançadores).  

Feitas as contas, eram 464 mísseis de cruzeiro, com alcance mais que suficiente para atingir Moscovo e com a precisão para entrar pela porta da frente do Kremlin.  E o “Glick-em” não era a única arma nuclear de reacção rápida da NATO com que os Soviéticos tinham de se preocupar.  Nem sequer a mais assustadora…

Mapa com a localização aproximada das bases de mísseis GLCM na Europa.


Texto e seleção de imagens: Icterio
Edição: Pássaro de Ferro

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