Resposta soviética – SS-4 Sandal e SS-5 Skean
Nesta altura a NATO elencava 3 tipos de resposta nuclear; retaliação directa, escalada deliberada ou resposta nuclear geral. Um dos problemas destas doutrinas, por muito bem estruturadas e delineadas que sejam, é que podem ser rapidamente ultrapassadas pelas acções inesperadas do oponente. Seria confortável que o inimigo reagisse proporcionalmente aos ataques mas o perigo da resposta ser “desproporcional” era muito real e potencialmente devastadora. Mas vamos retomar o ponto anterior; a política de “first-use”, ou “first-strike”, da NATO. Perante a incapacidade de conter um ataque mecanizado Soviético a NATO iria usar armas nucleares tácticas – projécteis de artilharia e mísseis Lance - com ogivas de muito baixo rendimento, mas devastadoras para as formações blindadas Russas. Qual seria a resposta? A doutrina do Pacto de Varsóvia vertia o seguinte;
A guerra seria resultado do “aventureirismo” da NATO (onde já ouvimos isto?...). A ofensiva Russa maciça por terra e ar iria empurrar esta agressão da NATO, penetrar em profundidade no território inimigo e destruir as suas forças no processo. A velocidade do avanço seria crucial para capturar as armas nucleares tácticas e enevoar ao máximo as linhas da frente – restringindo o uso dessas mesmas armas. Caso o inimigo (NATO) recorra a armas nucleares, de forma localizada ou a nível de teatro de operações, as restrições quando ao uso de armas nucleares será removida. Estas armas tornam-se os meios legítimos, e mais importantes, para destruir o inimigo em batalha – aliás, qualquer hesitação iria desperdiçar a vantagem da iniciativa.
O S-4 Sandal (em acima) e SS-5 Skean (em baixo) serviam tanto como ameaças veladas às grandes cidades europeias como símbolos do poder militar Soviético. A destruição que uma ogiva de 2 magatoneladas provocaria numa cidade como Londres ou Berlim era (e é) inimaginável e iria resultar, certamente, numa resposta com ICBMs dos EUA ou, em menor escala, no uso de mísseis Polaris lançados de submarinos Ingleses contra cidades Russas. Por outras palavras, a confirmação da doutrina MAD (Mutually Assured Destruction).
Portanto, o Pacto de Varsóvia iria responder imediatamente com o mesmo tipo de armas nucleares de curto e médio-alcance; artilharia, foguetes (FROG) e ataques aéreos tácticos. Mas os Russos dispunham de outras opções, mais devastadoras e muito mais preocupantes; nomeadamente, os mísseis balísticos SS-4 Sandal (R-12 Dvina) e SS-5 Skean (R-14 Chusovaya). Vamos analisar com algum detalhe para perceber do que realmente são capazes. O Sandal foi um MRBM (Medium-Range Ballistic Missile) de bastante sucesso, famoso pela crise dos mísseis de Cuba, e produzido em grande escala. Tinha um alcance de cerca de 2000km e uma ogiva de 1 a 2 megatoneladas. Conforme vemos na simulação no mapa, este alcance permitia-lhe cobrir praticamente toda a Europa Ocidental (lançado de bases na Letónia ou Lituânia, por exemplo).
Mas convém realçar outras duas características; primeiro, era um míssil que usava combustível liquido, o que significa que poderia demorar entre 30 minutos a 3 horas para ficar pronto a ser lançado – dependendo do nível de preparação. Isto é relevante porque torna o Sandal um míssil de retaliação (ou “second strike”) e não uma arma de resposta rápida. Outro aspecto importante é o fraco CEP (Circular Error Probable); por volta de 2-3km, útil apenas para atacar alvos de “countervalue”.
Uma pequena tangente para explicar a diferença entre “counterforce” e “countervalue”. O primeiro envolve o ataque a alvos directamente relacionados com as forças nucleares inimigas; silos de mísseis balísticos, bases aéreas de bombardeiros estratégicos, portos de mar (SSBN), postos de comando nacional, etc, enquanto os alvos de “countervalue” não são militares mas preciosos, e também estratégicos, para o adversário (grandes centros populacionais e estruturas civis industriais). Mas o que os diferencia em termos operacionais? Essencialmente, a precisão dos mísseis. Alvos de “counterforce” são, geralmente, pequenos e muito bem protegidos – silos reforçados com vários metros de betão ou centros de comando subterrâneos – que exigem ogivas de grande potência e/ou precisão. A letalidade de um míssil é uma função do rendimento da ogiva, composição do solo, integridade estrutural do alvo e da precisão da ogiva.
Destes, a precisão é o mais importante. O diagrama acima ajuda a entender; para garantir a destruição (com 90% de probabilidade) de um silo construído para resistir a 1000psi, um míssil com uma ogiva de 10 megatoneladas tem de acertar a, no máximo, 550m de distância. Se a precisão por melhorada em 50% (para 275m), uma megatonelada será suficiente.
Assim sendo, o Sandal, com um CEP de 2-3km, não era capaz de ser usado contra alvos militares reforçados. Era, para citar um general Inglês, um “city-killer”, uma arma útil apenas para eliminar grandes cidades. Quanto ao SS-5 Skean, era uma evolução directa do Sandal mas com o dobro do peso, cerca de 80t. O precisão era um pouco melhor ao contrário do alcance, que quase dobrou, para 3700km – alargando a ameaça até à Gronelândia, Norte de África e Médio Oriente. Com este aumento de alcance o Skean entrava na classificação de IRBM (Intermediate-Range Ballistic Missile).
Estas armas mantinham toda a população da Europa refém e poderiam fazer a NATO pensar duas vezes antes de usar qualquer tipo de arma nuclear. São estes os ténues equilíbrios das doutrinas nucleares, das respostas e das inevitáveis, e imprevisíveis, contra-respostas. Estes equilíbrios, reais ou imaginários (o bluff e a dissimulação fazem parte do jogo), são positivos porque o medo das contra-respostas influenciam muito o ângulo e o âmbito das decisões e das estratégias. Mas, no final dos anos 70, este muito frágil equilíbrio foi posto em causa por uma nova arma russa. Uma arma que colocou a NATO à beira de um ataque de nervos…