domingo, 31 de março de 2024

Hughes OH-6 Cayuse (Loach), o melhor helicóptero ligeiro de combate? [M2482 – 27/2024] - Parte IV

 “Fish Hook”, Cambodja, 1970 (Episódio 4)

“Às vezes voávamos com as meninas da Cruz Vermelha, que apelidávamos de “Donut Dollies”, nas visitas às tropas no terreno.  É preciso compreender que raramente víamos mulheres com “olhos redondos”.  Com sorte, ao levar o CO ao hospital, conseguíamos olhar de relance para uma enfermeira, por isso, estas visitas das “Donut Dollies” tinham grande impacto no moral dos homens.  Quando nos chamavam para ir buscá-las, uma sentava-se na frente, junto com o piloto e a outra ia atrás.  Nestas ocasiões especiais era nossa tradição aterrar de frente à entrada nas bases avançadas.  A rapariga ao lado do piloto (usavam sempre saias curtas) tinha de levantar a perna por cima da alavanca do cíclico para sair do “Loach”, e os soldados na base adoravam apreciar a…vista.  Isto funcionava com as miúdas novas, mas as mais experientes, e que já conheciam as nossas manhas, pediam-nos para colocar o helicóptero de lado.  Numa ocasião fui incumbido de transportar uma miúda para uma base na linha da frente.  Era muito bonita e foi um prazer vê-la ajustar-se no assento e a apertar o cinto.  Quando estávamos prontos para arrancar ela pergunta-me se eu a deixava pilotar.  “Claro” disse eu, “assim que estivermos no ar”.  Mas ela responde que consegue descolar e eu pensei, “sim claro, deves conseguir, deves”.  Disse-lhe que lhe entregava os controlos mas ia estar atento a tudo o que fazia.  Claro que eu pensava que ela não sabia o que estava a pedir e enquanto pensava no meu discurso condescendente de que “descolar um helicóptero é mais difícil do que parece” e… já estávamos no ar!  Ela descolou!  Suave, transição para voo, uso acertado dos pedais, tudo impecável.  Pilotou o caminho todo até á base e fez a aproximação para aterrar onde eu assumi os controlos e aterrei o “Loach” – provavelmente ela conseguiria aterrar também.  Ela disse-me que pilotava sempre que tinha oportunidade e os pilotos eram muito prestativos - ou ela aprendia muito rápido ou os instrutores davam-lhe toda a atenção.  Sempre me perguntei se ela teria seguido carreira na aviação.  Jeito não lhe faltava.”

Não perguntem.

Kurt Schatz, piloto de “Loach” da “1st Cavalry”, conta um episódio assustador ocorrido durante uma incursão no Cambodja que o próprio gosta de intitular de “Menino Perdido”; 

“Encontrámos montes de acção a Oeste do famoso “Fish Hook” – comboios de camiões do exército Norte Vietnamita carregados de tropas.  Os nossos “Cobras” (Bell AH-1 Hueycobra) faziam fila para mergulhar e metralhar as colunas inimigas. Faziam-me lembrar os filmes da 2ª Guerra Mundial, com os P-51 Mustang a atacar as tropas nazis.  No regresso à base encontrámos o maior inimigo do helicóptero: uma parede sólida de nuvens no horizonte, a tapar todas as saídas do Cambodja.  Não tinha muitas alternativas, estava a escurecer e o combustível a escassear.  Voávamos a 600 metros de altitude e sabíamos que aquela tempestade iria engolir-nos a qualquer momento.  O líder do grupo, a bordo de um “Cobra”, ordenou pelo rádio;

“Vamos descer.  Vamos passar por debaixo das nuvens e voltar para casa.”

Ainda estávamos bem dentro do Cambodja quando penetrámos na tempestade.  O “Cobra” ia na frente, mas era difícil acompanhá-lo e perdemo-lo rapidamente de vista nas nuvens.  Desesperado, pedi por ajuda;

“Não te consigo ver!  Perdi-te de vista!”

Mas a resposta do “Cobra” deixou-me branco como a cal;…

“Desculpa rapaz, mas estás por tua conta.  Vamos para IFR (voo por instrumentos) e ganhar altitude.”


O Bell AH-1 “Cobra” foi outro fenomenal helicóptero de combate.  O primeiro verdadeiro gunship, era venerado pelas suas tripulações e pelas tropas no solo.  Extremamente bem armado, ágil e muito rápido – tão rápido, que até um “Loach” tinha dificuldades em o acompanhar, conforme Kurt Schatz confirmou numa incursão no Cambodja em 1970. 

“Estava fo… lixado.  A chuva era tanta que os rádios deixaram de funcionar, um por um.  Como é que vou para casa agora?  A última transmissão que ouvi do “Cobra” foi; “Dirigi-te para Leste…”, e o rádio pifou de vez.  Pairei por cima de umas árvores para tentar perceber a minha situação mas a chuva intensificava cada vez mais.  A única forma de ver qualquer coisa era por esticar a cabeça para fora da cabina mas a escuridão era total.  Não tinha escolha.  Liguei as luzes para iluminar a selva abaixo.  Assim, continuei lentamente para Leste, logo acima da cobertura das árvores.  A dada altura, ao lado do meu patim direito vi uma estrada de terra.  Pelo menos era um caminho que podia seguir.  E lá fomos, lentamente acima da estrada, com as luzes acesas, á vista de todos os inimigos nas redondezas!  Ao longe, na estrada, vimos uma luz fraca por entre a chuva forte.  Desliguei as minhas luzes de imediato e discuti com a minha tripulação o que fazer.  “Rapazes, temos de decidir.  Aquela luz ou é o inimigo ou as nossas tropas.  Eu não faço ideia, se calhar ainda estamos no Cambodja.  Temos duas hipóteses; voltamos para trás nesta estrada e ficamos sem combustível ou descobrimos que luz é aquela.

Eles já podiam ter disparado, por isso eu acreditava que não deveria ser o inimigo.  Concordámos em descobrir a fonte da luz.  Aterrei o “Loach” na estrada e saquei do meu revolver .38.  O observador saiu com o lançador de granadas M79 e o artilheiro saltou com a M60 e várias fitas de munição por cima dos ombros e desapareceu na escuridão em direcção à misteriosa luz.  Depois do que pareceu ser uma eternidade, o artilheiro finalmente regressou e com o maior sorriso que já vi na vida.

“Sir, é a nossa malta!  É uma base de artilharia.” 

Graças a Deus, o menino perdido encontrou o caminho para casa.”     


Um artilheiro, armado com uma metralhadora M60, demonstra a posição de vigilância e combate a bordo de um “Loach”.  Esta posição aumentava bastante os ângulos de visão e de tiro do artilheiro mas também o expunham mais ao fogo inimigo.  É possível ver também as placas de blindagem laterais do assento frontal.


Texto e seleção de imagens: Icterio
Edição: Pássaro de Ferro


1 Comentários:

Anónimo disse...

Há Cayuses com muita sorte.

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