Kosovo, o regresso da limpeza étnica ao coração da Europa
(Episódio 3 - Último)
Com o pod TIALD (Thermal Imaging Airborne Laser Designator) os pilotos dos Harrier
viram facilitada a tarefa de identificar e atacar com elevada precisão alvos pequenos
e camuflados mas, por vezes, esse sistema revelou um comportamento algo…
temperamental. O Tenente Zanker
descobriu essa faceta da tecnologia num ataque a 19 de Abril. O alvo era um depósito de munições e de
mísseis SAM SA-6 no aeroporto de Pristina – alvo que já tinha surgido na lista
no dia 29 de Março mas, nessa ocasião, as fracas condições meteorológicas
“riscaram” a missão. Três semanas depois,
e com o clima mais favorável, Zanker liderou uma formação de quatro Harrier rumo a Pristina;…
“Quando nos aproximamos da área notei algumas
nuvens baixas, mas nada que impedisse o ataque.
Liguei o pod TIALD e orientei a mira na direcção do alvo – conseguia ver
claramente o edifício no pequeno ecrã no cockpit. Como a mira não estava exactamente centrada
usei o comando direccional na manete de aceleração com o polegar esquerdo e
pressionei o botão “lock”. A partir
daqui o sensor deveria bloquear e seguir automaticamente o alvo. Como tudo parecia porreiro, pressionei o
botão de disparo do laser. Com o sistema
em modo “auto” agora era só esperar que o computador largasse as bombas no
momento adequado. Passados alguns
momentos senti um ligeiro duplo tremelique no Harrier seguido do característico
sinal sonoro agudo – as duas bombas
Paveway de 500kg estavam a caminho!
“Passados
uns 5 segundos, começo a notar uma nuvem no topo do ecrã e a mover-se lentamente
em direcção á mira… Nesta altura o
software do pod TIALD deveria entrar no modo “memória” e manter o laser
minimamente apontado no alvo, mas…não.
Em vez disso, a mira ganhou vida própria e começou aos saltos a perseguir
a nuvem para fora do ecrã! Perdi
completamente de vista a mira e sabe-se lá para onde estaria a orientar as
bombas! Reiniciei o pod e, o mais
rapidamente possível, voltei a orientar a mira para o telhado do alvo e, não me
perguntem como, as bombas Paveway ainda arranjaram energia suficiente para se
orientarem até ao centro do edifício que, literalmente, desapareceu num imenso
“flash”.”
Especialistas de armamento inspeccionam bombas Paveway II, prontas a ser carregadas no Harrier logo atrás. Nesta foto é possível apreciar o verdadeiro volume
desta potente arma de 454kg de peso e quase 4 metros de comprimento.
As realidades da guerra, e o sempre
presente perigo de provocar baixas civis, ficou novamente espelhado na missão
de 30 de Abril – uma ataque que envolveu seis Harrier a uma ponte sobre o rio Uvac em Kokin Brod, na Sérvia
Ocidental. Novamente, o Tenente Zanker
recorda o incidente;…
“Perto
do ponto de largada das bombas notamos novamente algumas nuvens soltas mas, ao
pesquisar mais adiante com a ajuda do sensor infravermelho do TIALD, confirmei
que as condições pareciam melhores.
Ainda não conseguia ver a ponte mas estava confiante que teria tempo
suficiente para a encontrar e atacar com precisão. O par de Harrier á minha frente largou as
bombas conforme planeado e passados alguns segundos avistei a estrutura da
ponte – era agora a minha vez de lançar.
Dispensei a função “auto-track” e fiz “zoom” sobre a ponte. Via perfeitamente os arcos metálicos e
apontei manualmente o laser para o centro do tabuleiro. Disparei o laser e, de quando em vez,
ajustava ligeiramente a mira para manter o alvo bem centrado. As bombas demoraram o que pareceu uma
eternidade até chegar ao solo, mas acabaram por acertar no tabuleiro com uma tremenda
explosão.”
“Slides” tirados de um pod TIALD de um ataque a um depósito
de munições Sérvio. Nesta ocasião as
condições climatéricas eram bastante favoráveis mas num dia de nebulosidade ou
com mais humidade no ar, a aquisição de alvos seria muito mais complicada.
“Mal regressamos a Gioia del Colle todos os
pilotos reuniram-se na sala de operações para visualizar em detalhe o ataque. O software do pod TIALD permitia rever toda a
gravação sobreposta com as conversações rádio e uma série de dados de voo. Além disso, ao vermos o vídeo na tela gigante
conseguíamos visualizar de forma mais ampla, e com muito mais detalhe,
comparado com o minúsculo ecrã de 10cm no cockpit do Harrier. Com uma cerveja na mão e bem sentados
iniciamos a projecção do “filme” e vimos de imediato a estrutura da ponte, a
estrada, as rampas de acesso, as bermas, tudo.
Mas também vimos no topo da tela outra coisa… um carro civil a
dirigir-se lentamente para a entrada da ponte.
Ninguém viu aquele carro durante o ataque mas agora na enorme tela
vimo-lo imediatamente.
“Oh
não”, alguém exclamou atrás de mim, “quando tempo é que ele tem?”
O
carro entra devagarinho na rampa da ponte e segue tranquilamente.
“Menos
de 40 segundos…”, responde o líder ´Benny` Ball.
Ouvimos
o som agudo do laser activo e sabíamos que as bombas já estavam no ar.
“Porque
que é que ele vai tão devagar?!
Acelera!! C’mom mate!!”
Gritávamos
para a tela como se estivéssemos a ver um jogo de futebol em directo quando, na
realidade, o destino daquele desgraçado já tinha sido traçado há um par de
horas. Quando faltavam 20 segundos para
o impacto o carro passou directamente sobre a mira laser no centro da ponte!
“Go,
go, go!!”, gritávamos a plenos pulmões.
A sala começou a encher-se de gente atraída por toda aquela comoção e
gritaria. Muitos deles, ao verem as
imagens, rapidamente se juntavam ao coro colectivo. No
momento em que o carro pareceu sair do tabuleiro a tela tornou-se
totalmente branca – o flash da explosão “cegou” momentaneamente o sensor IR do
pod TIALD e deixou todos na assistência em total “suspense”… Quando o ecrã recuperou a definição, vimos o
carro parado na berma da ponte. Todos
ficamos em silêncio e temíamos o pior.
De repente, o carro arranca a grande velocidade e desaparece de vista! Um dia de sorte para ele….e para nós!”
Sempre que possível, os pilotos dos Harrier em Gioia del Colle usavam a técnica STOVL (Short Take-Off and Vertical Landing) –
não só permitia descolar com cargas mais pesadas como aumentava os limites de
segurança.
O destacamento de Harrier GR.7 da RAF voou 870 missões operacionais durante a
Operação Engadine. Toda essa experiência foi muito útil para
identificar as limitações do pod TIALD e das bombas guiadas por laser Paveway, especialmente em condições
meteorológicas adversas, típicas do centro da Europa. Estas lições levaram directamente à adopção
da bomba Enhanced Paveway II que
acrescentava GPS ao sensor laser. Assim,
quando os Harrier voltaram ao
combate, no Iraque em 2003, trouxeram novas armas, novos sensores e novas
tácticas.
Mas isso será história para outro dia.


10:01
António Luís











































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