Kosovo, o regresso da limpeza étnica ao coração da Europa
(Episódio 2)
O Tenente Martin Ball relembra os preparativos para a missão de 28 de Março;
“A primeira decisão para o ataque dessa noite seria sobre o método de designar alvos; iria cada Harrier transportar um pod TIALD e uma bomba Paveway guiada por laser ou ficaria um Harrier (em cada par) responsável pela operação do pod e o seu asa (ou nº 2) transportaria a bomba (“buddy spiking”)? Havia bons argumentos a favor de cada opção mas, para este ataque, optamos pelo método de “buddy spiking”, principalmente pela pressão acrescida de sucesso. Notar também que o alvo estaria bastante mais longe do que anteriormente, o que aumentava o risco de exposição ás defesas anti-aéreas. Mas, pelo menos, esta noite não teríamos de nos preocupar com os F-16s!”
“Esta seria a nossa primeira missão contra um inimigo preparado e furioso. Tornava o planeamento complicado. As simples rotas de entrada e saída do território, e até ao alvo, eram intensificadas por muitos “ses”, tais como; ameaças, evasão, cronometragem e possíveis “abates”. Depois de horas de muito coçar a cabeça foi quase um alívio entrar no meu Harrier, devidamente preparado pelos excelentes técnicos e engenheiros de terra. Senti a tensão no ar enquanto subia as escadas para o cockpit mas depois de me sentar na apertada cadeira, e só com os meus pensamentos como companhia, finalmente relaxei. Carreguei os dados do meu “tijolo” no computador do Harrier – estava tudo aqui; cada “waypoint”, timings, frequências de rádio, etc. Tudo corria perfeitamente, excepto uma coisa. Enquanto manobrava o avião até ao início da pista, senti um enorme desconforto e muito calor. Abri ligeiramente a canópia para deixar entrar algum ar mas não era suficiente - decidi retirar os óculos de protecção laser, já me estavam a irritar! Preferia correr o risco de sofrer algum dano laser nos olhos. Além disso, era muito escuro e ainda tinha que usar NVGs por cima. Descolámos á hora prevista e seguimos para o Adriático. Com o alvo a cerca de 370km de distância, tínhamos um longo caminho a percorrer – e boa parte em território inimigo.”
Excelente foto das operações em Gioia del Colle durante a operação Allied Force. O Harrier GR.7 mais próximo transporta mísseis AAM Sidewinder e contentores de submunições RBL755.
“O voo decorreu sem surpresas, tudo dentro do normal – demais, até. Tudo muito silencioso e estranhamente tranquilo nos céus da ex-Jugoslávia. O RWR também não se queixou mas ao aproximarmo-nos do IP (Initial Point) as coisas começaram a acelerar. Era altura de accionar o pod TIALD e encontrar o alvo. A minha responsabilidade era encontrar e designar o alvo com o laser (“spiker”) enquanto o meu asa lançava a bomba Paveway. Primeiro uso a menor magnificação para pesquisar a zona e depois faço “zoom” no alvo específico. Não é tão fácil fazer isto no cockpit como na tela da sala de operações ou num simulador… Os segundos passavam e eu não encontrava o raio do alvo! Ali está! Agora é só apontar o laser. È preciso cuidado para não usar demasiado “zoom”, senão a imagem surge muito “pixelada” no meu pequeno visor a preto-e-branco. Comunico com o meu asa e ele confirma o sinal laser e o alvo. Agora é só aguardar pelo lançamento das Paveway. Nada! Que se passa?! A bomba ficou presa! Isto não fazia parte do plano! “
“Iniciamos a rota de fuga da zona alvo – duas curvas para a direita e invertemos a direcção de voo. Restava-mos aguardar pelos próximos Harrier que voavam um minuto atrás de nós. Esperávamos que tivessem mais sorte. Ouvimos pelo rádio o sinal sonoro do lançamento da Paveway e aguardamos ansiosamente 30 segundos – o tempo de voo da bomba de 454kg. Um flash enorme, seguido de outro flash ainda maior passado outro minuto – sucesso! Por momentos esqueci-me que ainda estava em território inimigo por isso, sem demora, ganhamos altitude e rumamos á base. Quando aterramos fomos recebidos com inúmeros apertos de mão e igual número de cervejas e assim que despachamos os F700s (formulários) seguimos para a sala de operações para rever as imagens do ataque. Os resultados foram prontamente enviados para o MoD (Ministério de Defesa) – finalmente a nossa primeira história de sucesso para os jornais!”
O pod TIALD (Thermal Imaging Airborne Laser Designator) foi uma ferramenta essencial para aumentar a precisão dos ataques aéreos da RAF – não só da frota de Harrier mas também dos Jaguar e Tornado. Teve o seu “baptismo de fogo” na Guerra do Golfo em 1991.
A partir de Abril a missão CAS (Close Air Support – Apoio Aéreo Próximo) começou a ocupar cada vez mais os pilotos dos Harrier. Em vez de bombardeamentos pré-programados com rotas e alvos, relativamente, bem definidos, nas missões CAS a identificação do inimigo era fluida e imprevisível. O terreno acidentado, um inimigo experiente e bem camuflado e a reduzida visibilidade própria das condições climatéricas nos Balcãs, conspiravam para tornar estas missões extremamente intensas, exigentes e perigosas. Em cima de tudo isso, a possibilidade de danos colaterais ou baixas civis assombrava a todo o momento os pilotos da NATO. Isto ficou bem demonstrada no dia 14, quando dois pares de Harrier (liderados pelo Capitão Cockrell e Tenente Zanker) foram requisitados por um F-16 AFAC (Airborne Forward Air Control) para atacar uma coluna de veículos perto de Dakovica. O Tenente Zanker relembra;
“O pedido pareceu-me de imediato estranho, porque os Sérvios não tinham o hábito de estacionar colunas de veículos nas estradas em plena luz do dia. Chegamos á área e vimos uma vila e uma longa estrada em direcção a um rio. E, de facto, entre a vila e o rio era discernível uma extensa coluna de veículos parados na berma. Com os meus binóculos consegui detectar alguns blindados de transporte de tropas no fim e início da coluna mas a maior parte dos veículos eram tractores agrícolas com atrelado. Alguns dos tractores eram vermelhos e os campos adjacentes estavam cheios de civis. Discutimos a situação – nós, os quatro pilotos de Harrier da formação – numa frequência de rádio fechada e rapidamente concordamos que se tratava de uma coluna de refugiados escoltada por militares Sérvios.”
“Conseguimos convencer um piloto de A-10, que voava na zona, para executar uma passagem a baixa altitude, e ele confirmou que a coluna era, de facto, civil. Abortamos a missão e regressamos a Gioia del Colle. Mais tarde fomos informados que uma outra coluna de veículos, repleta de civis, naquela mesma área, tinha sido bombardeada por F-16s umas horas antes, o que causou na altura um enorme embaraço para a NATO.”
https://en.wikipedia.org/wiki/NATO_bombing_of_Albanian_refugees_near_Gjakova
A intervenção da NATO no Kosovo relembrou a extrema dificuldade na detecção, identificação e designação de alvos em cenários intensos de CAS. A restrição de bombardear apenas de média altitude, fora do alcance das armas anti-aéreas ligeiras, contribuiu para aumentar as dificuldades e a probabilidade de erro.
1 Comentários:
O black hawk virou marsupial:
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INCRÍVEL transformação! Black Hawk vira U-Hawk: "abre a frente" e voa por até 14h sem escalas
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https://m.youtube.com/watch?v=EZSiXYq888w&pp=ugUHEgVwdC1CUg%3D%3D
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