domingo, 12 de outubro de 2025

RAF Harrier GR.7, o guerreiro da guerra fria - [M2657 - 80/2025 ]

Kosovo, o regresso da limpeza étnica ao coração da Europa 

(Episódio 2)

O Tenente Martin Ball relembra os preparativos para a missão de 28 de Março;

“A primeira decisão para o ataque dessa noite seria sobre o método de designar alvos; iria cada Harrier transportar um pod TIALD e uma bomba Paveway guiada por laser ou ficaria um Harrier (em cada par) responsável pela operação do pod e o seu asa (ou nº 2) transportaria a bomba (“buddy spiking”)?  Havia bons argumentos a favor de cada opção mas, para este ataque, optamos pelo método de “buddy spiking”, principalmente pela pressão acrescida de sucesso.  Notar também que o alvo estaria bastante mais longe do que anteriormente, o que aumentava o risco de exposição ás defesas anti-aéreas.  Mas, pelo menos, esta noite não teríamos de nos preocupar com os F-16s!”

“Esta seria a nossa primeira missão contra um inimigo preparado e furioso.  Tornava o planeamento complicado.  As simples rotas de entrada e saída do território, e até ao alvo, eram intensificadas por muitos “ses”, tais como; ameaças, evasão, cronometragem e possíveis “abates”.  Depois de horas de muito coçar a cabeça foi quase um alívio entrar no meu Harrier, devidamente preparado pelos excelentes técnicos e engenheiros de terra.  Senti a tensão no ar enquanto subia as escadas para o cockpit mas depois de me sentar na apertada cadeira, e só com os meus pensamentos como companhia, finalmente relaxei.  Carreguei os dados do meu “tijolo” no computador do Harrier – estava tudo aqui; cada “waypoint”, timings, frequências de rádio, etc.  Tudo corria perfeitamente, excepto uma coisa.  Enquanto manobrava o avião até ao início da pista, senti um enorme desconforto e muito calor.  Abri ligeiramente a canópia para deixar entrar algum ar mas não era suficiente - decidi retirar os óculos de protecção laser, já me estavam a irritar!  Preferia correr o risco de sofrer algum dano laser nos olhos.  Além disso, era muito escuro e ainda tinha que usar NVGs por cima.  Descolámos á hora prevista e seguimos para o Adriático.  Com o alvo a cerca de 370km de distância, tínhamos um longo caminho a percorrer – e boa parte em território inimigo.”

Excelente foto das operações em Gioia del Colle durante a operação Allied Force.  O Harrier GR.7 mais próximo transporta mísseis AAM Sidewinder e contentores de submunições RBL755.

“O voo decorreu sem surpresas, tudo dentro do normal – demais, até.   Tudo muito silencioso e estranhamente tranquilo nos céus da ex-Jugoslávia.  O RWR também não se queixou mas ao aproximarmo-nos do IP (Initial Point) as coisas começaram a acelerar.  Era altura de accionar o pod TIALD e encontrar o alvo.  A minha responsabilidade era encontrar e designar o alvo com o laser (“spiker”) enquanto o meu asa lançava a bomba Paveway.  Primeiro uso a menor magnificação para pesquisar a zona e depois faço “zoom” no alvo específico.  Não é tão fácil fazer isto no cockpit como na tela da sala de operações ou num simulador…  Os segundos passavam e eu não encontrava o raio do alvo!  Ali está!  Agora é só apontar o laser.  È preciso cuidado para não usar demasiado “zoom”, senão a imagem surge muito “pixelada” no meu pequeno visor a preto-e-branco.  Comunico com o meu asa e ele confirma o sinal laser e o alvo.  Agora é só aguardar pelo lançamento das Paveway.  Nada!  Que se passa?!  A bomba ficou presa!  Isto não fazia parte do plano! “

“Iniciamos a rota de fuga da zona alvo – duas curvas para a direita e invertemos a direcção de voo.  Restava-mos aguardar pelos próximos Harrier que voavam um minuto atrás de nós.  Esperávamos que tivessem mais sorte.  Ouvimos pelo rádio o sinal sonoro do lançamento da Paveway e aguardamos ansiosamente 30 segundos – o tempo de voo da bomba de 454kg.  Um flash enorme, seguido de outro flash ainda maior passado outro minuto – sucesso!  Por momentos esqueci-me que ainda estava em território inimigo por isso, sem demora, ganhamos altitude e rumamos á base.  Quando aterramos fomos recebidos com inúmeros apertos de mão e igual número de cervejas e assim que despachamos os F700s (formulários) seguimos para a sala de operações para rever as imagens do ataque.  Os resultados foram prontamente enviados para o MoD (Ministério de Defesa) – finalmente a nossa primeira história de sucesso para os jornais!”

O pod TIALD (Thermal Imaging Airborne Laser Designator) foi uma ferramenta essencial para aumentar a precisão dos ataques aéreos da RAF – não só da frota de Harrier mas também dos Jaguar e Tornado.  Teve o seu “baptismo de fogo” na Guerra do Golfo em 1991.

A partir de Abril a missão CAS (Close Air Support – Apoio Aéreo Próximo) começou a ocupar cada vez mais os pilotos dos Harrier.  Em vez de bombardeamentos pré-programados com rotas e alvos, relativamente, bem definidos, nas missões CAS a identificação do inimigo era fluida e imprevisível.  O terreno acidentado, um inimigo experiente e bem camuflado e a reduzida visibilidade própria das condições climatéricas nos Balcãs, conspiravam para tornar estas missões extremamente intensas, exigentes e perigosas.  Em cima de tudo isso, a possibilidade de danos colaterais ou baixas civis assombrava a todo o momento os pilotos da NATO.  Isto ficou bem demonstrada no dia 14, quando dois pares de Harrier (liderados pelo Capitão Cockrell e Tenente Zanker) foram requisitados por um F-16 AFAC (Airborne Forward Air Control) para atacar uma coluna de veículos perto de Dakovica.  O Tenente Zanker relembra;

“O pedido pareceu-me de imediato estranho, porque os Sérvios não tinham o hábito de estacionar colunas de veículos nas estradas em plena luz do dia.  Chegamos á área e vimos uma vila e uma longa estrada em direcção a um rio.  E, de facto, entre a vila e o rio era discernível uma extensa coluna de veículos parados na berma.  Com os meus binóculos consegui detectar alguns blindados de transporte de tropas no fim e início da coluna mas a maior parte dos veículos eram tractores agrícolas com atrelado.  Alguns dos tractores eram vermelhos e os campos adjacentes estavam cheios de civis.  Discutimos a situação – nós, os quatro pilotos de Harrier da formação – numa frequência de rádio fechada e rapidamente concordamos que se tratava de uma coluna de refugiados escoltada por militares Sérvios.”

“Conseguimos convencer um piloto de A-10, que voava na zona, para executar uma passagem a baixa altitude, e ele confirmou que a coluna era, de facto, civil.  Abortamos a missão e regressamos a Gioia del Colle.  Mais tarde fomos informados que uma outra coluna de veículos, repleta de civis, naquela mesma área, tinha sido bombardeada por F-16s umas horas antes, o que causou na altura um enorme embaraço para a NATO.”  

https://en.wikipedia.org/wiki/NATO_bombing_of_Albanian_refugees_near_Gjakova

 

A intervenção da NATO no Kosovo relembrou a extrema dificuldade na detecção, identificação e designação de alvos em cenários intensos de CAS.  A restrição de bombardear apenas de média altitude, fora do alcance das armas anti-aéreas ligeiras, contribuiu para aumentar as dificuldades e a probabilidade de erro. 


Texto e seleção de imagens: Icterio
Edição: Pássaro de Ferro


1 Comentários:

Anónimo disse...

O black hawk virou marsupial:


"

INCRÍVEL transformação! Black Hawk vira U-Hawk: "abre a frente" e voa por até 14h sem escalas

"

https://m.youtube.com/watch?v=EZSiXYq888w&pp=ugUHEgVwdC1CUg%3D%3D

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