sábado, 9 de março de 2024

Hughes OH-6 Cayuse (Loach), o melhor helicóptero ligeiro de combate? [M2474 – 19/2024] - Parte I

Bien Hoa, Vietname, 1965 (Episódio 1) 

Para qualquer entusiasta da aviação, a guerra no Vietname imediatamente invoca imagens dos versáteis F-4 Phantom, dos impressionantes bombardeiros B-52 Stratofortress ou dos ágeis MiG-21 Fishbed.  Se perguntarem por helicópteros, bem, a resposta é ainda mais fácil; o Bell UH-1 Iroquois (nome que ninguém usava), mas universalmente conhecido como “Huey”, foi “O” helicóptero do Vietname.  Mas como em todos os conflitos, também existiram máquinas que, apesar de não partilharem a mesma fama, partilharam os mesmos perigos e as mesmas tribulações.  Uma dessas máquinas foi o fenomenal Hughes OH-6 Cayuse (nome que também ninguém usava), mais conhecido como “Loach”.  Leve, incrivelmente ágil, potente e robusto, o pequeno helicóptero era venerado pelas tripulações.  A missão de reconhecimento e busca que desempenhavam exigia coragem (ou “loucura”, conforme as opiniões), perícia e uma boa dose de sorte.  E o “Loach” era a máquina certa para o trabalho.  

O OH-6 “Loach” no seu habitat natural.  Muito leve (menos de 500kg vazio e cerca do dobro á descolagem) e extremamente directo nos controlos, o helicóptero da Hughes revelou-se uma soberba peça de engenharia aeronáutica e um autêntico deleite de pilotagem.  Segundo os pilotos do Exército Americano que transitaram da anterior geração de helicópteros com motores de pistão (mais pesados e lentos) foi como passar de uma “banheira” Cadillac para um Porsche!


Dizia-se no Vietname que as tripulações de reconhecimento tinham tomates do tamanho de bolas de basquete mas cérebros do tamanho de ervilhas.  Não era para menos.  Ao contrário da maioria dos pilotos, as tripulações de helis de reconhecimento viam o inimigo olhos nos olhos.  Voavam a poucos metros do solo, á procura de pequenos sinais como pegadas, fogueiras ou algum objecto estranho.  Faziam-no logo acima da copa das árvores ou até, por baixo delas!  Quando encontravam o inimigo o procedimento padrão era marcar o alvo com uma granada de fumo e pedir um ataque de artilharia ou a ajuda dos gunships “Cobra” mas, com o inimigo a poucos metros de distância, o contacto violento era muitas inevitável e violento.  Mas a melhor forma de conhecer mais sobre as missões e experiências destas tripulações, e dos seus “Loach”, é ouvir da boca dos próprios.  O piloto Tom Pearcy recorda como numa das suas primeiras missões no Vietname a bordo do “Loach” as coisas não correram como o planeado…

Um dos primeiros OH-6A a chegar ao Vietname, neste caso o S/N 65-12925, o décimo da linha de montagem.  Também um dos primeiros a ser equipado com a Minigun XM27 no lado esquerdo da fuselagem.  As tripulações de reconhecimento pagaram um preço elevado em tripulações e helicópteros.  Segundo o DoD foram perdidos 4867 helicópteros no Sudeste Asiático entre Janeiro de 1962 e Março de 1973.  A maioria eram, obviamente, “Hueys” mas, em termos proporcionais, os “Loach” sofreram o maior número de baixas; dos 1419 produzidos, 842 foram perdidos na guerra.


“O meu código era “Blue Ghost 18” e, junto com um UH-1C “Huey” gunship (pilotado pelo Greg e pelo Owens), tínhamos de averiguar uma base inimiga numa pequena aldeia.  O terreno era composto por colinas cobertas com árvores altas e espessas e periodicamente surgiam pequenas clareiras e arrozais.  Quando chegamos á aldeia notei algo que já tinha ouvido falar várias vezes mas nunca visto pessoalmente; tocas de aranha (spyder holes).  Vi quatro ou cinco ao longo de um trilho rumo á aldeia.  Chamei a atenção do meu artilheiro, o Ed Gay, e voltei para trás para ver melhor.  Quando me aproximei, as coberturas dos buracos foram pelos ares e saíram de lá vários indivíduos a disparar com AK-47s e espingardas de ferrolho!  Claro que a vinha voz subiu várias oitavas quando gritei; “Estão a disparar contra nós!”.  O Ed ficou tão exaltado que atirou uma granada de fumo sem tirar a cavilha.  O Greg perguntou pelo rádio de onde vinham os disparos e eu respondi; “Ali atrás! Ali atrás!”, sem lhe dar indicações nenhumas de direcção.  Fiz nova curva de 180º e dirigi-me á área para a marcar com fumo, e desta vez executei alguns ziguezagues, mas voltamos a ser atingidos algumas vezes.  A minha voz subiu mais seis oitavas mas conseguimos lançar a granada de fumo no alvo.  Enquanto o Greg lançava foguetes de 70mm eu transmitia-lhe as correcções necessárias; “um pouco mais á esquerda”, “50 metros mais á frente”.  A seguir ouvi o Ed com uma voz trémula; “Sir…Sir…uh…árvore!!”  Olhei para a frente e vi a maior árvore imaginável mesmo em frente ao meu nariz!  Virei á esquerda com toda a força e falhei a árvore por meros centímetros (na realidade seriam 1 ou 2 metros).  Mas isto tudo fazia parte do plano VC, porque aquela árvore estava armadilhada com minas claymore, ou algo parecido.  A explosão arrancou a cauda e o rotor traseiro, o motor começou a fazer uma chiadeira terrível e parou logo a seguir.  Voei por mais uns 50 metros e senti que o controlo do helicóptero estava a fugir-me rapidamente.  As palavras do meu instructor vieram-me á mente; “Há sempre lugar para aterrar um helicóptero numa emergência”.  Ah é, sabichão?  Então onde vou aterrar no meio deste arvoredo todo?  Acabei por fazer uma auto-rotação a velocidade zero e nivelei no topo das árvores.  Caímos uns 9-12 metros por entre a folhagem e acabamos invertidos com as pás do rotor a cortar uma espécie de clareira.  Desliguei o sistema eléctrico e saímos do “Loach” apenas com as nossas armas e algumas granadas de fumo.  Lembro-me de ver os meus dedos ensanguentados, o meu co-piloto tinha as calças molhadas e o artilheiro sofreu uns arranhões na cara, cortesia da sua metralhadora M60.  Por isso, nada de grave.  Depois descobrimos que as granadas de fumo eram todos de cor verde - não iriam servir de muito no meio daquela vegetação.  Mas o Greg, mesmo assim, encontrou-nos sem grande problema e algum tempo depois ouvimos um veículo blindado de transporte de tropas M113 que nos recolheu.  O “Loach” foi mais tarde recolhido e reparado.”   

Os engenheiros da Hughes fizeram um trabalho notável no design do Cayuse.  A colocação do motor (neste caso, uma turbina Allison T-63 de 250cv de potência e apenas 62kg de peso!) num ângulo de 42º permitiu economizar muito espaço com a vantagem adicional de tornar o acesso mais fácil para manutenção.  A lendária robustez e “sobrevivência” do helicóptero também muito deve á localização da turbina.  Conforme o diagrama, a turbina, caso de solte numa queda ou aterragem de emergência, não atinge a tripulação.  O cubo do rotor e a transmissão também estão montados acima da antepara principal, o que aumenta a rigidez da estrutura.  Em helicópteros como o famoso “Huey”, as turbinas, transmissão e cubo estão montados directamente acima da cabina e facilmente esmagam a tripulação numa crash-landing.  Outro problema da montagem “alta” destes componentes é o elevar do centro de gravidade e, num impacto frontal, o peso vai forçar e enterrar o cockpit contra o obstáculo.  Dizia-se no Vietname que; “se tiveres mesmo de te despenhar num helicóptero, que seja num Loach”…

Texto e seleção de imagens: Icterio
Edição: Pássaro de Ferro




2 Comentários:

TopGum disse...

Obrigado pela partilha

Anónimo disse...

Espectáculo AL, nunca me enganaste... welcome back!
5513

ARTIGOS MAIS VISUALIZADOS

CRÉDITOS

Os textos publicados no Pássaro de Ferro são da autoria e responsabilidade dos seus autores/colaboradores, salvo indicação em contrário.
Só poderão ser usados mediante autorização expressa dos autores e/ou dos administradores.

 
Design by Free WordPress Themes | Bloggerized by Lasantha - Premium Blogger Themes | Laundry Detergent Coupons
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...>